NEUTRALIDADE 

 

("Quem sou eu?")

 

 

Muita gente diplomada, reverenciada e celebrada nos diz que pensamentos positivos devem ser cultivados, para que possamos vencer no mundo. Se o teu objetivo é este, acho que deves acreditar naqueles guias e não precisas continuar esta leitura; mas, se aspiras a mesma vitória alcançada pelo Senhor Jesus ("Eu venci o mundo"), talvez seja interessante investires alguns minutos lendo sobre o que apreendi, através dos ensinamentos de um pobre ermitão da selva, e que venho confirmando na vida cotidiana.

Como mencionado no texto "Um Sonho de Natal", descobri, na prática, que pensamentos positivos são quase tão prejudiciais quanto os negativos. Para quem não consegue afastar estes por outros meios, aqueles podem ser úteis, pelo menos no início da jornada espiritual, quando a mente ainda é muito egoisticamente forte e altamente rebelde (tentei isto, até perceber que tal caminho não me servia e abandonei-o em pouco tempo).

Além de não proporcionar quietude mental ao buscador, que é unanimemente apontada, pelos Sábios, como condição indispensável para obter-se paz de espírito e felicidade, percebo um outro perigo, no caminho do pensamento positivo. Supõe que te aferrasses ao pensamento "eu tenho saúde". É sabido que tudo no que pensamos insistentemente, acaba se concretizando, cedo ou tarde; contudo, valerá a pena este esforço? Se conquistasses a tão sonhada saúde perfeita, qual seria a tua conclusão? Atribuirias unicamente a Deus este milagre, ou teu ego se inflaria, diante da agradável ilusão de ter poder para mudar o destino? Agirias como o Grande Instrutor, diante de Seus milagres, ou como os mágicos circenses? Considerando a natureza humana, provavelmente escolherias a segunda opção, que é bem mais prazerosa. Então, em vez de ajudar-te, o positivismo tornar-se-ia um obstáculo em teu caminho; começarias a usar esta força para o mal, isto é, para realizar desejos e alcançar objetivos mundanos. Embora conseguir o que se deseja pareça ser o caminho para Paz e Felicidade, na verdade não é, pois quanto mais desejos são realizados, mais e mais deles surgem na mente e, consequentemente, mais distante fica a verdadeira Paz.

 Agora, imagina o que pode acontecer com aqueles que meditam em "eu sou Deus", sem a orientação correta... Embora não use esta técnica, acho que, por exemplo, o tema "eu sou filho de Deus" é menos perigoso do que "eu sou Deus", quando o buscador não tem a ventura de estar aos pés de um verdadeiro Mestre. Sem a proximidade da Graça Viva, o ego pode estar com força máxima; mas, em contrapartida, teria menos espaço para divagações fantasiosas, se for usado o primeiro tema. O mais prudente, portanto, é tomarmos muito cuidado com os pensamentos positivos.

Todavia, se não queres dar a mínima chance ao adversário, sugiro, sem receio de prejudicar-te, a autoinvestigação proposta por Ramana Maharshi: "QUEM SOU EU?". Aqui, não há pensamentos positivos ou negativos, apenas a neutralidade, e o ego não tem para onde correr. Tenho consciência da grande dificuldade deste caminho, já que me foram necessários anos de prática diária, somente para ter noção de como usar a inquirição "quem sou eu?"; mas, muitos buscadores já o trilharam, antes de nós, e somos tão aptos quanto eles. O mais difícil, percebo hoje em dia, é discernir o que é o "eu" da pergunta. Não sei se adianta este intermediário tentar explicar a sua experiência, pois o Mestre respondeu a centenas de perguntas sobre isto...

Bem... como estou aqui como divulgador, vou descrever a percepção recente, que trouxe um pouco de Luz para esta alma. Durante a meditação "quem sou eu?, quem sou eu?", quando mentalmente repetires "eu", concentra-te totalmente na sensação de tua existência. Esta pode ser discernida, comparando-a com a sensação da tua inexistência (inconsciência mental), que acontece quando estás dormindo (sim: no fundo de ti há uma testemunha do teu próprio sono, pois não és a mente). Analisa as duas situações: vigília (presença do 'fulano de tal' e de suas percepções) e sono sem sonhos (ausência do 'fulano de tal' e de suas percepções). O que interiormente percebes, aqui e agora, que inexiste enquanto dormes? Exemplos: corpo físico, emoções, pensamentos, etc. Toma, então, uma das sensações que existe apenas enquanto estás acordado (experimenta todas e usa a que mais te convém), como o "eu" da autoinvestigação. Mantém-te atento e retorna ao sentimento "eu" escolhido, sem desanimar, quando perceberes que a mente está vagando; dá o mínimo de espaço possível para pensamentos voluntários ou involuntários. O Sábio de Arunáchala alerta para não nos distrairmos com respostas mentais, que porventura ocorram: nada que venha da mente, é confiável; a verdadeira resposta da investigação interior "Quem sou eu?" é indescritível através de palavras, e virá espontaneamente e de forma inconfundível, no momento certo. Garante-nos Ele que, este momento, é o mais importante da Existência, pois teremos alcançado a Meta da Vida, o Reino de Deus, a Paz e a Felicidade eternas e incondicionais, que sempre (e unicamente) estiveram dentro de nós.

O método deste sublime Mestre me parece que é melhor descrito em um livro que, afortunadamente para os buscadores nacionais, foi publicado há pouco tempo aqui no país: "Os ensinamentos de Ramana Maharshi em Suas próprias palavras".

Boa sorte para todos nós.

 

 

P.S.: O ano novo já deve estar com cara de velho, para o pessoal que se recupera do réveillon: mais uma desilusão...

 

 

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02/01/2010

 

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