QUEM É DE QUEM?

 

 

O mundo é nosso, ou nós somos do mundo? Quem é de quem?

Quem ainda não começou a interiorizar a atenção (isto é: não começou a praticar o autoconhecimento), responde sem vacilar: "o mundo é meu". Contudo, apesar de já ter iniciado a Busca Interior, sou forçado a admitir que sou do mundo, que o mundo ainda é o meu senhor.

Logo abaixo, pequeno trecho retirado da bela obra "O Evangelho de Ramakrishna". Uma lição, que me fez abaixar a cabeça, envergonhado.

 

"Almas apegadas são aquelas que estão enredadas no mundo; ninguém pode despertá-las. Não despertam nem mesmo depois de receber golpes e mais golpes da desgraça, das tristezas e dos sofrimentos indizíveis. Ao camelo agradam os arbustos espinhosos e, ainda que estes lhe sagrem a boca quando os come, não deixa de apaixonadamente estimá-los; ninguém pode apartá-lo deste alimento. Da mesma forma, as almas apegadas ao mundo podem sofrer grandes penas e desgraças; porém, depois de alguns dias, continuam como antes, nada aprendem. A esposa pode morrer ou fazer-se desonesta e, ainda assim, o ex-marido se casará novamente; se o seu filho morrer, ele ficará muito triste, mas logo o esquecerá. A mãe do menino morto pode ficar acabrunhada pelo desgosto durante um tempo, porém aos poucos voltará a preocupar-se com a aparência pessoal, enfeitando-se com jóias.

"As pessoas mundanas podem ficar na indigência, depois de casar os filhos e estes saírem de casa; não obstante, continuarão gerando outros, todos os anos. Não conseguirão alimentá-los e educá-los, mas continuarão tendo mais. Podem perder a fortuna na justiça, todavia voltarão em breve aos tribunais. Podem, as vezes, perceber que suas vidas estão erradas, mas não podem abandoná-las, nem fixar seus pensamentos em Deus. Vejo (Ele, Ramakrishna) os velhos jogando cartas calmamente, como se ainda não tivesse chegado o tempo de meditar no Senhor do Universo.

"Se a alma apegada for afastada do mundo e posta em ambiente espiritual, definhará até morrer. No mundo, tem ânimo para trabalhar como escrava e não vacila em dizer mentiras, enganar e adular, para ganhar a vida. Considera loucos os que investem tempo, meditando em Deus. Nunca acha tempo ou ocasião, para dedicar a assuntos espirituais. Pode ir a lugares santos, mas seus pensamentos continuam no mundo. Até na hora da morte, sua mente estará voltada para as coisas mundanas."

 

 

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No texto anterior ("Um sonho desmascarado") me comprometi a, no seguinte, esclarecer o que senti ser errado na frase: "Há muitos anos venho refletindo sobre os níveis de consciência que percebo em mim mesmo". Como o assunto acima me parece interligado com este, os dois acabaram ficando juntos, sob o título "Quem é de quem?".

 

Cometi o erro de, no momento da revelação citada no parágrafo acima, não ter imediatamente transcrito, em palavras, a sensação intuitiva (não-intelectual) que manifestou-se. Agora, mais de um mês depois, a força daquela certeza desapareceu e não sei se conseguirei lembrar e transmitir, com razoável fidelidade, o que ocorreu interiormente. De qualquer forma, vou tentar...

QUEM percebe os níveis de consciência e QUEM é afetado por eles? Sou duas individualidades, uma observando e outra atuando? Tem coisa errada aí... Na ocasião em que aquela frase foi escrita (20/03/2010), tive a sensação de que estava, de alguma forma indefinida, sendo enganado pela mente. Lembro que (mais uma vez) vislumbrei o quão escravizados estamos a ela e que, tudo o que fazemos sob seu comando, nada nos aproxima da Iluminação. Então, senti que foi/tem sido pura perda de tempo, todo o trabalho de criar e manter este sítio na web, escrever mais de 50 textos, etc. Continuo a fazer isto, porque é o carma quem manda em "mim" e não "eu". Quem do lado de cá escreve, é a mente e, quem do outro lado lê, também é a mente; portanto, nem o escritor e nem o leitor podem beneficiar-se, espiritualmente, do conteúdo publicado na página "Os Destruidores de Ilusões" (e em outras páginas, equivalentes).

Estamos nos iludindo, quando imaginamos que acumular, intelectualmente, conhecimentos espirituais, nos aproxima do Criador, ou quando sonhamos/desejamos alcançar o Reino de Deus e ser felizes. Isto nunca acontecerá para "nós", isto é: para a consciência/individualidade que escreve e para a consciência/individualidade que lê. Como mencionado anteriormente, o foguete que viaja para a Lua deixa pelo caminho o enorme mecanismo propulsor, que o impulsionou em direção ao espaço. Até vencer a gravitação terrestre, aquela força propulsora é indispensável, mas, após isto, torna-se um estorvo e deve ser abandonada; apenas a cápsula lunar chega ao destino. Da mesma forma, nós, buscadores, nunca alcançaremos a meta, pois somos o propulsor e não a cápsula. Cada um deve abandonar a si mesmo, se realmente almeja completar a divina missão. Ego, individualidade ou "eu" é o oposto de DEUS ("EU"). Se O amamos de todo Coração, temos que morrer para o ego/mundo, para "nós" mesmos; não há outra escolha. Como ensinou o Grande Instrutor, devemos pôr a cruz sobre os ombros e caminhar para o calvário, por livre e espontânea vontade ("Quem abandonar/perder a vida, por Mim, encontrará a VIDA"). Assim fazem, desde sempre, todos os Sublimes Mensageiros do Altíssimo que vêm ao mundo.

Algumas pessoas podem argumentar que, assim como o propulsor é indispensável durante a primeira parte da jornada do foguete, o ego também o é, até certo ponto da Busca da Verdade ("EU"). Isto deve ser assim, mas que cada um medite (não-intelectualmente) sobre tal argumentação e decida se há sinceridade nela ou se é apenas mais uma artimanha mental, outra forma sutil de prolongar, ao máximo possível, sua querida existência atual...

 

 

OBS.: a comparação com o foguete e verbos como "aproximar", "alcançar", "encontrar", etc., não são estritamente corretos, pois sugerem distância e separação entre o Criador e Suas criaturas. Como ensinam os Sábios, a Verdade é que DEUS e Seus filhos são UM; o Reino de Deus está aqui e agora, dentro de nós. Gostaria de repetir que, em relação à Unicidade, escrevo sem a devida comprovação pessoal, mas sempre me baseando nas palavras de homens nos quais confio irrestritamente.

 

 

 

Que a Graça Divina, nossa única salvação, nunca Se faça esquecida nos corações daqueles que buscam...

 

01/05/2010